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O decreto 11.835/2023 publicado nesta quinta-feira, 21 de dezembro, que altera a estrutura de governança da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, não era um tema desconhecido do setor. Contudo, fontes ouvidas sobre o tema mostraram surpresa e indignação com um ponto específico: o aumento do número de conselheiros da câmara em uma decisão unilateral quanto à determinação de que é o presidente do conselho que terá o chamado ‘voto de qualidade’, nos casos de empate nas deliberações, representante este que será indicado pelo Ministério de Minas e Energia.

A avaliação é de que essa é uma intervenção do Estado em uma entidade de caráter privado. E mais, terá controle sobre a movimentação do dinheiro do mercado. Isso pode não significar algo de bom ou ruim, mas, em termos de governança do setor, está na contramão do que vem se trabalhando para aprimorar como um todo, depois de atuações questionáveis de órgãos diversos em pontos de competências de outras entidades.

De acordo com o artigo 9 do decreto, o Conselho de Administração será responsável por acompanhar e orientar o planejamento estratégico da CCEE, com a atribuição de definir as diretrizes de planejamento orçamentário e de deliberar sobre as propostas orçamentárias apresentadas pela Diretoria, dentre outras definidas em seu estatuto social. O Conselho será formado por oito membros, eleitos em Assembleia Geral, com mandatos de dois anos, não coincidentes, permitidas duas reconduções. Dos oito membros, quatro serão indicados pelo MME, o presidente e outros três.

Os novos termos indicam que o orçamento deverá ser aprovado por pelo menos quatro conselheiros, antes era apenas em Assembleia Geral com os associados da CCEE.

O diretor da Neal Energia, Edvaldo Santana, diz que o aumento do orçamento dessa mudança será elevado e vê o voto qualificado do presidente do Conselho como a pior decisão que se teve com esse decreto. “Esse será o embrião da formatação de uma nova estatal. A CCEE, com esse decreto, virou uma estatal”, criticou ele, que trabalhou na elaboração do Decreto 5.177/2004, que regulamentou a criação da câmara.

Em sua análise, essa questão do que classificou como ‘voto de minerva’, trará mais dor de cabeça para o mercado, pois no decreto de duas décadas atrás os votos tinham o mesmo peso e, por isso, o número ímpar no conselho, agora com essa configuração e esse peso do voto, o ministério é quem comandará a entidade na prática.

“Era necessária uma mudança, mas não com o exagero que se fez com essa medida”, avaliou Santana.

O presidente do Fórum das Associações do Setor Elétrico, Mário Menel, diz que há dois problemas, um é o número de conselheiros e o poder do voto desse conselheiro indicado pelo MME. “A não ser uma coisa excepcional, as decisões sempre cairão a favor do governo justamente na casa do mercado. Me parece ser a decisão equivocada. A CCEE deveria ser mais mercado e menos governo”, afirmou.

Outra crítica é a questão do controle do orçamento na mão de um board que tem a presença do Estado. Ainda mais porque são os agentes do mercado que pagam por esse orçamento e passou a ser a União de forma indireta a controlar o destino desses recursos.

Menel ainda cita outras mudanças implementadas, mas que foram positivas em sua análise como a eliminação da Superintendência da CCEE, a criação de uma diretoria executiva de acordo com as práticas da iniciativa privada, a contribuição associativa mais justa na divisão dos custos. Além disso, ações que geram custos serem pagos via emolumentos – ou seja, por quem usa – é um avanço.

O presidente executivo da Abraceel, Rodrigo Ferreira, destacou que a entidade recebeu com muita preocupação o decreto da CCEE. “Na nossa visão, a Câmara terá um conselho absolutamente desproporcional à sua natureza jurídica, que é privada”, aponta.

Esse tema da governança do setor já era uma preocupação da entidade, externada na Reportagem Especial do Final do Ano publicada pela Agência CanalEnergia. Por isso, lembra que “se buscava uma governança melhor e mais independente para a CCEE e os agentes contribuíram nessa linha, contudo o Decreto aponta na direção contrária do que se buscava”, acrescenta.

Alexei Vivan, presidente da ABCE e que é advogado do setor, diz que também vê com preocupação essa medida. Ressaltou o fato de que a CCEE é uma entidade de direito privado sem fins lucrativos. Ele concorda com os especialistas ouvidos ao afirmar que da forma que veio o decreto é o governo quem assume o controle da entidade.

“Esse decreto foi publicado sem discussão prévia com a sociedade e com os agentes. É algo que preocupa, a CCEE é a casa do mercado e deveria continuar assim, gerida pelos membros que a formam”, destaca. “Precisamos avaliar se esse decreto não violaria o artigo 4o da lei 10.848/2004, pois é lei e se for assim deveria passar pelo Congresso Nacional”, sugere.

Raphael Gomes, sócio de Energia no Lefosse Advogados, afirma que a decisão foi a pior possível em toda a história da CCEE em termos de governança. “Esse decreto traz um risco sem precedentes ao setor elétrico”, define. “A governança ficou ruim por ser uma entidade de direito privado tendo o governo como a entidade que toma decisão”, reforça. Ele lembra que os sinais estavam sendo dados quando o ministro criticou a abertura do mercado livre como o fato que estaria gerando aumento da tarifa no mercado, mas essa medida não estava no radar, apesar de diversos pontos de atenção que investidores estrangeiros questionavam-no sobre o ambiente regulatório no país.

Ele avalia que a questão toda está no precedente que se abriu com a mudança. Ele diz que é possível que as pessoas que ocupem os cargos possam trazer decisões de qualidade técnica que é a caraterística da CCEE, mas abre um precedente caso haja uso político da situação.

“Ficou claro que o governo tomou conta da CCEE”, aponta o advogado. “Essa situação está clara que privilegiará os interesses do governo, seja ele qual for”, pontua ele, lembrando que a CCEE é quem gere a liquidação do mercado de energia no país, operação de R$ 7 bilhões ao mês, tem também a gerência sobre os encargos do setor que eram atribuição da Eletrobras quando estatal. Ele também define que essa medida vai na contramão do que se esperava e que representa a estatização da entidade.

Para Urias Martiniano Neto, sócio do escritório Urias Martiniano Advogados, o decreto foi o fruto de um desejo antigo na CCEE e dos agentes que desejavam a revisão da estrutura organizacional da entidade até para ir ao encontro do que é praticado por outras instituições privadas.

A nova estrutura pode trazer mais agilidade para a câmara. Contudo, a forma que o texto veio não foi a ideal. É importante entender o que o mercado de energia quer por ser uma entidade privada. “O que temos que esperar é que façam as indicações e que estas sejam privilegiando a parte técnica”, sugere. “O setor precisa que a CCEE continue com viés técnico que a caracteriza”, sinaliza.

Processo 

Essa mudança que foi implementada pelo governo federal já era esperada pela CCEE que vinha trabalhando no assunto há anos. O tema foi retomada nesse ano conforme explicou o conselheiro Eduardo Rossi, em agosto. Contudo, o que estava no foco era apenas a criação da diretoria executiva para ficar no dia a dia da entidade, como realmente ocorreu. O conselheiro comentou à época que a forma mais rápida seria a alteração do Decreto 5.177/2004. Confira a reportagem aqui. 

A entidade aponta que vem trabalhando nessa ideia a mais de 12 anos. Em nota afirma que teve um avanço significativo com a edição do decreto. Destaque dado à criação de uma Diretoria para a organização e a segregação das funções deste órgão e do Conselho de Administração, que teve como referência proposta apresentada e debatida com o mercado ao longo de 2023.

“A decisão procura aproximar a estrutura das melhores práticas nacionais e internacionais de mercado, além de preparar as bases para o enfrentamento dos desafios futuros do setor, como a abertura do Ambiente de Contratação Livre – ACL, as novas regras de Segurança e Monitoramento na comercialização de energia”, aponta a nota.

E ainda diz que o Decreto também garante o arcabouço legal necessário para assegurar a representação de consumidores com carga inferior a 500 kW por meio de agentes varejistas e reforça a possibilidade da atuação da Câmara em sistemas de certificação de energia. E aponta que nos próximos meses, a organização concentrará seu empenho em convocar e apoiar a Assembleia Geral dos agentes para que se possa implementar as alterações no estatuto social necessárias ao cumprimento do decreto. Também se coloca à disposição para oferecer todo o suporte para que a Agência Nacional de Energia Elétrica possa readequar a Convenção de Comercialização no prazo estipulado.