O Tribunal de Contas da União determinou à Agência Nacional de Energia Elétrica que exclua dos processos tarifários aprovados a partir janeiro de 2020 despesas com “subsídios de qualquer natureza, que não estejam diretamente relacionados à política tarifária do setor.” A decisão vai implicar revisão da composição do próprio orçamento da Conta de Desenvolvimento Energético, onde estão concentrados os subsídios custeados pelos consumidores de energia elétrica. Em 2019, o valor total das cotas da CDE incluído na conta de energia é de R$ 17,2 bilhões, em um orçamento total de R$ 20,2 bilhões.

O TCU cita especificamente descontos tarifários concedidos a atividades de irrigação e aquicultura; a empresas de saneamento; à atividade agropecuária, incluindo o beneficiamento e a conservação de produtos, em área rural ou urbana e à agroindústria. A determinação alcança também residência utilizada por trabalhador rural ou por trabalhador rural aposentado; produtores rurais que exerçam agricultura de subsistência; prestadores de serviço público de irrigação rural e escolas agrotécnicas sem fins lucrativos situadas em zona rural, mas, nesses casos, há uma ressalva quanto à possibilidade de que os descontos sejam mantidos, caso o Comitê de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas Federais e o Ministério das Minas e Energia comprovem o caráter social dos benefícios.

Os descontos tarifários concedidos à atividade rural e às empresas de água e esgoto foram criados por leis ou decretos, mas, na avaliação do tribunal, eles extrapolam os limites estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal em relação aos conceitos de preço público e política tarifária. Por esse entendimento, são, portanto, ilegais e inconstitucionais. Auditoria feita pelo tribunal nos gastos da CDE mostra que entre 2013 e 2017 as reduções concedidas à tarifa rural e à do saneamento básico chegaram a R$ 17,535 bilhões.

Em dezembro do ano passado, o Decreto 9.642, publicado no apagar das luzes do governo Michel Temer, estabeleceu a redução gradual dos subsídios na tarifa de energia elétrica para esses dois segmentos em um período de cinco anos, contados a partir de janeiro de 2019. Sob pressão da bancada ruralista, o governo Bolsonaro recuou e publicou um novo decreto (9.744) em abril desse ano, suspendendo o dispositivo do decreto que acabava com a cumulatividade de descontos para atividades como aquicultura e irrigação. O decreto 9.642 ainda pode ser anulado, caso um projeto de decreto legislativo (o PDC nº7) já aprovado na Comissão de Minas e Energia da Câmara passe pelo plenário da casa.

O TCU também deu prazo de 120 dias para que a Casa Civil da Presidência da República e o Ministério de Minas e Energia concluam a elaboração do plano de redução estrutural das despesas da CDE previstos na Lei 10.438 e promovam as mudanças necessárias. A prioridade, segundo o tribunal, serão os gastos não estão alinhados à legislação do setor elétrico e à Constituição Federal.

Entre as ações exigidas do governo, está o aperfeiçoamento da governança dos subsídios custeados pela CDE que forem mantidos, “cuidando para que todas as políticas públicas associadas a esses encargos tenham metas, público-alvo, prazos de duração, elaboração de indicadores e sistemática periódica de avaliação.”

Até mesmo subsídios com finalidade de beneficiar determinados sociais terão de ser reavaliados pelo MME. Subsídios intrassetoriais, como descontos no uso da rede concedidos a fontes renováveis de geração de energia terão que ser analisados caso a caso para determinar seu enquadramento nos princípios da política energética. O entendimento do tribunal é de que se o governo considerar importante manter incentivo, por exemplo, à atividade agrícola por avaliar o peso desse setor econômico na balança comercial, cabe ao Tesouro pagar a conta, e não aos demais consumidores de energia.

Já a Aneel terá ainda que apresentar em 90 dias um plano de ação para fiscalizar os subsídios da CDE do ponto de vista do atendimento aos requisitos legais para a concessão dos descontos, a exemplo do que já é feito em relação à Conta de Consumo de Combustíveis e à Tarifa Social de Energia Elétrica.