A Justiça Federal de Itaituba, no Pará, confirmou em sentença que o governo federal está proibido de licenciar a UHE São Luiz do Tapajós sem antes realizar a consulta prévia, conforme prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho. A sentença, do juiz Ilan Presser, confirma decisões anteriores no mesmo processo. Todas determinam que a consulta seja realizada com povos indígenas e ribeirinhos, antes da emissão de qualquer licença ao empreendimento.

A sentença diz que não se pode ignorar a assertiva de que a vontade da Convenção 169 da OIT e do artigo 231 da Constituição é que a partir do exercício do direito de consulta seja permitida a preservação e fomento do multiculturalismo; e não a produção de um assimilacionismo e integracionismo, impostos pela vontade da cultura dominante em detrimento dos modos de criar, fazer e viver dos povos indígenas, que corre o grave risco de culminar em um etnocídio.

A sentença também ressalta que na leitura dos autos está se invertendo indevidamente as fases do licenciamento, com os réus suprimindo direitos de minorias assegurados na consulta. Durante o processo judicial foram feitas manifestações pelos réus – Eletrobrás, Eletronorte, Aneel e Ibama – que indicam, de acordo com a sentença judicial, falta de conhecimento sobre as comunidades indígenas e tradicionais que habitam a região e serão afetadas pelos empreendimentos.

A decisão judicial menciona a situação da terra indígena Sawré Muybu, dos índios Munduruku, que teria parte significativa de seu território alagada pela usina e é objeto de outro processo judicial, em que o governo tenta protelar a demarcação – já em fase avançada – com o objetivo não declarado de facilitar o licenciamento da usina. Os argumentos do governo nos dois processos são complementares e autoexplicativos. No processo sobre a terra indígena, a Fundação Nacional do Índio alega que não há prioridade na demarcação. No processo sobre a usina que vai afetar a terra indígena, é a vez da Eletrobras e da Aneel alegarem que sem demarcação, não cabe consulta prévia.

O Ministério Público Federal, autor da ação sobre a consulta dos povos afetados pela usina, também solicitou à Justiça que obrigasse estudos mais amplos sobre os impactos. O projeto do governo é para pelo menos cinco barragens no rio Tapajós e os impactos conjuntos ou sinérgicos sobre a bacia hidrográfica deveriam ser melhor avaliados. O MPF pediu ainda a obrigação de estudos de Avaliação Ambiental Integrada e Avaliação Ambiental Estratégica, ambos previstos na legislação ambiental brasileira. Na sentença, o juiz considera que falta comprovação suficiente da eficácia desse modelo e que a Avaliação Ambiental Integrada é tanto mais necessária pelo fato das usinas do Tapajós afetarem um mosaico de áreas especialmente protegidas onde se localizam terras indígenas, de comunidades tradicionais e unidades de conservação, seja de uso integral, seja de uso sustentável.