Três anos se passaram desde a publicação da Medida Provisória 579, em 11 de setembro de 2012, e o governo ainda procura meios para reorganizar o setor elétrico. Por azar ou equívoco político-regulatório, a medida que teve como intenção reduzir a tarifa de energia do consumidor cativo em 20%, hoje resulta em um ‘tarifaço’ de mais de 50%. De fato, nem tudo pode ser colocado na conta da MP 579. Parte da crise do setor elétrico foi agravada pela hidrologia desfavorável dos últimos três anos, como lembrou José Carlos Miranda, atual presidente da Chesf.

"O problema que passamos hoje tem pouca relação com a MP 579", afirmou. "Em minha opinião, acertamos com a MP579. Não é justo o consumidor pagar por uma usina que está amortizada. O dono da usina é a sociedade brasileira. O justo para o consumidor é pagar pelo custo de operação, manutenção, modernizações e uma taxa de retorno justa para o operador da usina. Do ponto de vista de justiça, de adequabilidade de custo, acertamos com MP 579", defendeu o executivo que à época da publicação da medida fazia parte da diretoria da Empresa de Pesquisa Energética, órgão de planejamento do governo. 

Porém, desde que a MP passou a vigorar, uma atmosfera de instabilidade regulatória e insegurança jurídica se instalou no setor. Quem aderiu a medida sofreu redução drásticas em suas receitas e viu suas ações derreterem no mercado de capitais, como foi o caso do Grupo Eletrobras. Sete medidas provisórias e uma série de regulamentos foram publicados para corrigir as imperfeições da MP579, o que evidencia que a receita não estava bem fermentada.

A Conta de Desenvolvimento Energético – antes da ordem de R$ 3 ou 4 bilhões – saltou para R$ 25 bilhões em 2015 após assumir novas responsabilidades criadas pela MP.  As distribuidoras acabaram expostas involuntariamente, obrigando o governo a contratar empréstimos de mais de R$ 20 bilhões em 2014, a juros de mercado, para evitar que as concessionárias quebrassem.  Os empréstimos serão pagos pelos consumidores, via aumento nas contas de luz, entre 2015 e 2017. Se considerados os juros devidos aos bancos, serão repassados às tarifas nesse período cerca de R$ 30 bilhões.

Para o coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da UFRJ, Nivalde de Castro, a premissa do governo em reverter os ganhos ao fim das concessões para o consumidor estava correta. Porém, o governo errou ao antecipar a renovação, uma vez que muitos contratos venciam em 2017; e também pecou ao não discutir a medida com o setor.

Para Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, a MP desarrumou o setor elétrico de uma maneira inacreditável. "Por razões políticas, o governo resolveu se aproveitar da renovação das concessões para baixar a tarifa, ignorando totalmente o que estava acontecendo no mercado. O que se mostrava naquele momento específico era que a oferta [de energia] estava menor que a demanda. Tínhamos que aumentar o preço da energia. Isso detonou um processo de desorganização total do setor e para o azar do governo as chuvas foram ruins. O governo teve que ligar mais térmicas e para não prejudicar a eleição da presidente Dilma começou a criar uma série de remendos."

Segundo Pires, o governo criou uma conta de R$ 111,5 bilhões entre 2013 e 2015 por causa do acionamento térmico entre outros efeitos da MP. "Houve um gerenciamento dos reservatórios muito mais em função do calendário político do que da questão técnica. Se tivesse seguido o critério técnico, o correto era decretar um racionamento em 2014", afirmou Pires.  "Hoje o ambiente é caracterizado por instabilidade regulatória e insegurança jurídica. Com esses dois fatores você não consegue retomar o crescimento. Você não consegue atrair investidor sério para um volume de investimento nesse momento. E pior, você pode acabar atraindo para o setor empresas com baixa reputação", alertou.

Para Pedro Machado, sócio-diretor da consultoria especializada GV Energy & Associados, a MP “desarranjou e desequilibrou” o setor elétrico em todas as suas frentes e pilares. "Seja desestruturando os sinais tarifários, seja desestruturando os sinais de preços através da alteração das disponibilidades de geração, seja intervindo em sinais de preços de curto prazo para mitigar um impacto maior nas distribuidoras."