A MP da Eletrobras deve passar pelo Senado com alguns ajustes, mas mantendo as alterações polêmicas feitas pela Câmara dos Deputados, na avaliação do cientista político e sócio da Dominium Consultoria, Leandro Gabiati. Ele alerta que mais do que o processo de capitalização que vai levar à perda do controle da União sobre a estatal, está em jogo a própria reputação do governo diante do mercado e a capacidade de manter a governabilidade. A medida está na pauta da sessão deliberativa remota marcada para esta quarta-feira, 16 de junho.

“Você tem outras coisas por trás dessa MP 1031 que extrapolam e muito a capitalização da Eletrobras. Então, estamos falando de como o governo politicamente vai sobreviver ou ficar aqui até o fim da gestão, evidentemente se o presidente Bolsonaro não se reeleger. Você teria um ano e meio de governo em que haveria muitas dúvidas sobre a capacidade política do governo de aprovar medidas que ele entende necessárias”, afirmou Gabiati em entrevista ao CanalEnergia Live desta terça-feira, 15.

Com uma vitória folgada por 313 votos na Câmara dos Deputados, houve uma mobilização intensa do governo nos últimos dias para garantir a aprovação do texto pelos senadores. A MP terá de ser votada até o dia 22, já considerando o retorno do texto à Câmara, para não perder a validade.

Eventual rejeição ou caducidade da medida eliminaria qualquer chance de privatização da estatal pelo atual governo, considerando que 2022 é ano de eleição e nenhuma proposta nesse sentido passaria pelo Congresso.

Uma derrota em relação à proposta seria um baque político muito grande para o governo, pois sinalizaria que ele não aprova mais nada no que resta do ano e no ano que vem. Ainda mais quando a aprovação é por maioria simples, lembrou Gabiati.

Inicialmente resistente, os ministérios da Economia e de Minas e Energia tiveram que ceder e aceitar a inserção de pontos polêmicos, como a contratação de termelétricas a gás inflexíveis onde não há gasodutos nem disponibilidade do insumo; a prioridade para a compra de energia de pequenas centrais hidrelétricas em leilões e a prorrogação do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia (Proinfa) por mais 20 anos.

Para o consultor, é provável que o senador Marcos Rogério (DEM-RO), relator da matéria, tente fazer ajustes nesses pontos para diminuir as resistências ao texto e criar um espaço para que os senadores que apoiam a proposta de privatização da empresa possam votar favorável ao projeto de conversão.

Com as mudanças, teria que ser feita uma operação bastante rápida quando a Câmara receber o texto de volta, mas Gabiati lembra que Rogério tem dialogado deputado Elmar Nascimento, que relatou o texto na casa.

O senador ficou de apresentar o relatório nesta terça-feira, mas até o fechamento da edição o documento não estava ainda disponível. Havia expectativa de que ele só estivesse na página do senado na quarta. Para o entrevistado, o parlamentar está jogando com o calendário a seu favor para pressionar parlamentares favoráveis à capitalização da Eletrobras.

O texto pode incluir ainda alguns outros pontos, para que a MP avance. Um deles cria dispositivo que determina a sabatina pelo Senado de nomes indicados para a diretoria do Operador Nacional do Sistema. O presidente do senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) tem reclamado do tratamento dado à questão do reservatório de Furnas na crise hídrica, e já fez criticas à instituição.

Gabiati lembrou, porém, que o ONS é um ente privado, e que o Senado não teria atribuição constitucional para sabatinar nem diretores indicados pelo Ministério de Minas e Energia nem pelo setor privado. Esse seria, por exemplo, um ponto no qual o governo estaria livre para sinalizar a possibilidade de veto.

A mesma liberdade ele não terá no dispositivo que trata das termelétricas, das PCHs e do Proinfa. Todos esses penduricalhos foram incluídos no Artigo 1ºda MP, que autoriza a operação de capitalização da Eletrobras. O artificio usado por Nascimento impossibilita vetar esses pontos, porque ele comprometeria a própria essência da MP, que e a privatização da estatal.

Esse foi o cenário posto para o governo na Câmara. Ele teria de aceitar o texto com as modificações ou abrir mão da proposta, e  a escolha óbvia, destacou o consultor, foi avançar com a MP para garantir a aprovação de uma pauta que sinaliza não apenas com a desestatização da empresa, mas o avanço da agenda liberal e de reformas que a área econômica tem prometido ao mercado.