A Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia orientou seus associados a observarem a obediência aos contratos bilaterais negociados no ambiente livre, diante de “eventuais alegações de caso fortuito ou força maior,” para afastar a possibilidade de interferências externas nessas transações. A Abraceel se refere a uma eventual necessidade de recorrer à arbitragem para solucionar conflitos entres as partes, colocando na mão de terceiros uma decisão que pode ter desfecho imprevisível para os dois lados.

“Recomenda-se que as partes negociem alternativas de manutenção de seus contratos, em busca do benefício de evitar litígios, os quais, via de regra, impõem ainda mais custos, consomem tempo significativo e, por mais que se acredite no direito deduzido perante o tribunal eleito para solução do caso, têm desfecho de difícil previsão, além de conduzirem a solução por terceiros, fora do controle das partes”, observou a associação.

Em razão do impactos das restrições impostas pela crise do coronavírus sobre a atividade econômica, agentes de mercado tem defendido a adaptação dos contratos à conjuntura extraordinária. A Abraceel destacou que as partes são livres para determinar nos contratos do ACL as condições de comercialização de energia, o que inclui a incidência ou não de caso fortuito ou força maior, ou ainda os limites para o que pode ser enquadrado nessa classificação.

Por causa disso, alertou, é necessário seguir o que está previsto no contrato e analisar as circunstâncias específicas que afetam ou não o contratante que invocar a pandemia da Covid-19 como caso fortuito. Cláusulas de caso fortuito, na avaliação dos comercializadores, devem se limitar às medidas relacionadas à crise sanitária atual, para não se confundir os efeitos das restrições decretadas pelo estado de calamidade pública com eventual recessão econômica de efeito mais duradouro.

Como previsto na Convenção de Comercialização de Energia Elétrica, disputas em relação aos contratos de compra e venda de energia no mercado livre devem ser resolvidas por um tribunal arbitral escolhido pelas partes. Para a Abraceel, o ideal é que não se tenha que recorrer a essa instância.

A associação também lembrou que contratos pactuados entre agentes como geradores, autoprodutores, comercializadores e consumidores são instrumentos financeiros, que não pressupõem entrega física de mercadoria e tem seus desequilíbrios liquidados no mercado de curto prazo, ao Preço de Liquidação de Diferenças.

“Cabe ressaltar que caso o PLD estivesse acima do preço do contrato, dificilmente haveria denúncia de contrato, já que a sobra de energia seria liquidada gerando resultado positivo para o agente no Mercado de Curto Prazo – MCP no âmbito da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica)”, afirmou a Abraceel. Do ponto de vista da associação, a discussão se resume, portanto, à diferença entre o preço da energia estabelecido no contrato e PLD vigente, já que não existe de fato frustração do valor estabelecido previamente na negociação.

Para a aplicação da cláusula de caso fortuito, o consumidor deve comprovar que foi afetado pelo fechamento físico de seus estabelecimentos ou por impacto equivalente, como a redução da demanda provocada por medidas de restrição à circulação de pessoas. Deve ser feita também a comprovação de frustração de receita como efeito direto da quarentena; da impossibilidade de contornar a situação usando mecanismos como venda de excedentes ou liquidação no curto prazo e do impacto da diferença de preço na sustentabilidade do negócio.

Para comercializadores e geradores, que exercem a atividade de comercialização, é ainda mais difícil sustentar a tese, pois esses agentes têm como contornar os impactos dos eventos, e, além disso, a variação de preços e de demanda podem ser consideradas como risco de negócio, conclui a associação.