A liquidação financeira do mercado de curto prazo das operações de junho está mantida para o dia 5 (débito) e 6 (crédito) de agosto. A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica confirmou a realização, apesar do alto número de liminares concedidas pela Justiça. Um dos fatores que corroboram a tranquilidade da entidade demonstrada nesta sexta-feira, 24 de julho, em reunião com diversas associações do setor elétrico para tratar de assuntos diversos, é que a chamada de garantias financeiras foi atendida pela maioria dos agentes. Contudo, se o avanço das liminares continuar e não se encontrar uma solução para os imbróglios jurídicos, o mercado pode enfrentar uma situação mais complicada no próximo mês.

O cenário ainda é hipotético, disse o advogado especialista em energia do escritório Demarest Advogados, Raphael Gomes, mas com o aumento do volume de decisões judiciais pode-se chegar a um ponto no qual a liquidação pode ser inviável. Isso porque a operacionalização do mercado pode se tornar impossível de ser feita em decorrência de uma decisão judicial impedir uma medida que é protegida por uma outra decisão judicial. “O nível de judicialização pode acarretar ter que levar a CCEE a postergar a liquidação até que a situação se resolva”, disse Gomes.
E o cardápio de assuntos alvo de liminares atualmente é extenso. A última onda de ações protegeram geradoras contra a aplicação do fator de ajuste do MRE até o trânsito em julgado da ação que corre na Justiça. Sob esse guarda chuva estão associadas da Apine, PCHs e, mais recentemente, a Light e a Aliança Geração. Há ainda uma nova decisão liminar que excluiu o rateio do MRE da Rodeio Bonito, empresa que não estava protegida contra o impacto do GSF e que segundo as regras do mercado ficou com uma parcela da cota adicional que não foi repassada às geradoras que possuem a liminar contra a cobrança do GSF.
Entre outras liminares como a da CDE ajuizada pela Abrace e outras contrárias à Resolução CNPE 03, destaca-se a decisão que garante à Energia Sustentável do Brasil a aplicação de um excludente de responsabilidade de 535 dias. Segundo as contas da empresa, o montante a receber seria de R$ 2,5 bilhões.  
E ainda, está em trâmite na reunião da próxima terça-feira, 28 de julho, um pedido de medida cautelar por parte da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica com vistas à mitigação do inadimplemento das distribuidoras no mercado de curto prazo. Na teoria esse instrumento jurídico, explicou Gomes, é tomado quando há uma dívida que quer se discutir mas, sem a sua cobrança, pois dependendo do seu tamanho, geralmente pode impactar de forma severa uma empresa e quebrar uma organização.
O advogado que já trabalhou na CCEE disse que a avalanche de liminares pode levar à impossibilidade de se efetuar a liquidação. E destacou que a liminar obtida pela Rodeio Bonito tem esse potencial. Isso porque a câmara é um ambiente de negociações multilateral e que opera de forma centralizada. Consequentemente, explicou, uma decisão entre duas partes afeta um terceiro. E esse foi um dos pontos da decisão do juiz a favor da autora da ação contra a CCEE. “Se mais empresas obtiverem a mesma decisão em um extremo podemos ter inviabilizada a liquidação porque tantos terceiros estarão protegidos que os recursos ficarão em aberto”, alertou.
A ideia de adiamento da liquidação, semelhante ao que ocorreu no ano de 2012 é a pior decisão, disse ele. Isso porque há empresas contando com esses recebíveis para honrar compromissos no mercado. “Essa seria a última opção”, disse ele, apesar de outros agentes defenderem essa postergação enquanto não se tem uma definição de rumo por parte do governo quanto à questão do GSF, principalmente. “Valeria suspender se houver propostas a serem analisadas à mesa de negociações e desde que a decisão do caminho a ser tomado seja rápida”, enfatizou. Adiar a liquidação significaria criar problemas secundários tão fortes que vale arriscar ter um nível de inadimplência a não repassar o dinheiro para as térmicas.
Segundo João Carlos Mello, presidente da Thymos Energia, é justamente a operação das térmicas que está no cerne dessa questão. Segundo ele, o maior problema é que todo o mês se tem uma conta que varia de R$ 3 bilhões a R$ 5 bilhões a ser paga mensalmente e que começou a quase dois anos e vem impactando o fluxo de caixa das empresas, primeiramente as distribuidoras e agora as geradoras.
“Temos que ter um pacto para indicar uma saída para os geradores. Quem tem esse poder nas mãos é o governo que está sensível ao problema, mas que de alguma forma precisa tomar ações”, comentou Mello. Segundo ele, alguém terá que pagar essa conta e pode ser que seja o governo, pois o cenário atual é decorrente de sua atuação. Se essa conta realmente migrar para o governo poderá até mesmo comprometer o esforço pelo ajuste fiscal que tem sido implementado esse ano.